O dia era segunda-feira e um sol morno pairava sobre a cidade do Rio de Janeiro. Eram exatamente três horas da tarde quando minhas pernas firmes e determinadas caminhavam em sentido à praia do Arpoador.
Enquanto eu caminhava, sentia que algo me impedia de erguer a vista. Havia muita claridade, é verdade… o sol ardente reluzia diretamente contra meu rosto e me forçava a espremer os olhos. A areia da praia de Copacabana, que corria à minha esquerda, parecia um imenso espelho solar. Mas não era isso que pendia meu pescoço e me forçava a olhar para baixo: na minha mão direita, com Tinder aberto no meu celular, eu revisitava as mensagens que trocamos na noite anterior.
Essa era minha primeira semana no Rio. Esse era meu primeiro encontro por aqui — e, na verdade, o primeiro encontro em semanas.
Meu estômago dava reviravoltas, retorcia-se inteiro mas não de nervosismo… de excitação. Uma alegria indescritível me causava cócegas e me fazia rir sem motivo algum. Meu coração dava pancadas fortes no meu peito e era ao ritmo dessas pancadas que minhas pernas se moviam.
Fechei o aplicativo no celular e permaneci olhando para baixo. Via meus pés se moverem e contava os passos até chegar ao Arpoador.
Do encontro até hoje, seis dias se passaram…
Hoje, novamente, eu caminho olhando para baixo… o celular à mão direita, desta vez com o WhatsApp aberto. Ando lentamente, desta vez com a Praia de Copacabana à minha direita. Um dia chuvoso acerca e umedece a minha vista. Meus olhos fixados à tela do celular, olham tensos para nossa conversa de WhatsApp e aguardam, ansiosamente, pela mensagem que ela disse que enviaria ainda hoje… mas esse hoje já foi há dois dias atrás.
Quando acordei nessa manhã do dia 29 de setembro eu sentia uma combinação estranha de sentimentos. Nos encontramos na segunda, na quinta e na sexta… mas nesse último dia havia algo de frio entre nós. Eu temi que essa frieza fosse sinal de que nunca mais nos veríamos… mas não era apenas isso...
Eu permaneço olhando para o meu celular há mais de 3 horas, ainda na esperança de receber alguma mensagem sua. Mas nenhum sinal dela.
Ela não me respondeu, e talvez jamais responda… mas mesmo que me mandasse qualquer mensagem, nada do que ela escrevesse responderia à questão:
“Como pode um Estoico se permitir sofrer de amor?”
No final, é isso que me aflige: minhas expectativas sobre ela, sobre nossa possível relação.
Expectativas são a receita certa para gerar sofrimento. Ter expectativa significa esperar por algo. Se você espera, é porque não tem poder para fazer esse algo acontecer. Ou seja, ao longo desses últimos seis dias eu depositei minha felicidade na esperança de vê-la e de tê-la.
É óbvio.
Tão óbvio que se fosse somente isso, eu não teria acordado como acordei. Havia mais alguma coisa me incomodando… uma segunda frustração. Havia um sentimento tão sutil que quase se perdeu em meio às minhas mágoas amorosas.
Eu sinto uma frustração intelectual.
Meu ego está ferido. Quando abri os olhos pela manhã, só consegui pensar: “para quê eu estudo tanto sobre Estoicismo se não consigo nem me controlar diante de uma paixonite?”
E foi então que lembrei de Marco Aurélio.
Lembrei que o imperador romano escrevia para si mesmo justamente porque tinha dificuldade de lidar com suas próprias emoções.
Até mesmo o homem mais poderoso de Roma sofria de paixões.
Abri o livro Pense Como um Imperador no meu Kindle e comecei a ler sobre sua história. Algo me dizia que se há alguém capaz de me ajudar a resolver essa frustração, esse alguém foi Marco Aurélio.
Comecei a devorar suas páginas na busca de alguma história dele que fosse similar à minha. Páginas atrás de páginas correram diante dos meus olhos e fizeram meu coração se encher de uma nova angústia. Até que enfim eu achei essa passagem:
“Quando um de seus tutores mais amados morreu, conta-se que Marco chorou tão violentamente que os serviçais do palácio tentaram contê-lo. Eles estavam preocupados com as pessoas acharem o seu comportamento impróprio para um futuro governante. No entanto, Antonino (atual imperador) disse a eles para deixá-lo em paz. "Deixem que ele seja apenas um homem ao menos uma vez; pois nem a filosofia e nem o império livram um homem de seus sentimentos naturais."
Marco Aurélio era conhecido por ser um homem inteligente, amoroso, delicado e honrado desde jovem. Essa passagem que li trata-se de quando ele ainda era um adolescente. Mas seu coração imenso o acompanhou durante toda sua vida.
Marco Aurélio chorou diversas vezes em público. Era um sujeito tomado por fortes emoções e vivia em tempos de guerra. Que ser, em sã consciência, se manteria frígido diante desse cenário?
Ao ler essa passagem, eu entendi o que me angustiava.
Quando eu me tornei Estoico, eu queria ser senhor das minhas emoções. Eu acreditei profundamente que nunca mais sentiria nenhum sentimento negativo… eu criei uma expectativa.
Mas não é sobre isso que se trata o Estoicismo. Não tem a ver com não sentir nada ou suprimir emoções. Para ser Estoico eu preciso primeiro aceitar que emoções fazem parte de mim — como qualquer outro ser humano. Estou tão suscetível a paixões quanto qualquer pessoa.
Contudo, há uma diferença tamanha entre aceitar que eu tenho emoções e engajar com elas.
Todos nós haveremos de sentir tristeza: mas nenhum de nós precisa se tornar uma pessoa triste. Todos haveremos de sentir raiva, mas não precisamos nos tornar pessoas violentas.
Marco Aurélio foi o mais gentil e ao mesmo tempo o mais sereno imperador de Roma. Era um homem vulnerável às emoções, mas firme na razão. Essa combinação dava-lhe capacidade de experimentar a vida sem se apegar à vida.
O erro que cometi essa semana não foi me apaixonar. Pelo contrário: ter me apaixonado foi a melhor coisa que me aconteceu nesses últimos 6 dias.
Meu erro foi ter me apegado. Ter acreditado que ela estaria comigo outra vez. Tê-la desejado outra vez foi a real causa do meu sofrimento.
Certa vez ouvi um ditado de um homem sábio. Ele dizia:
"Ninguém tropeça em montanhas, são as pequenas pedras no caminho que nos fazem tropeçar."
À essa altura, já não importa mais se ela enviará ou não uma mensagem para mim. Só o que importa é que vivemos deliciosos momentos juntos. Essa memória me deixa feliz, mas nem por isso há motivo para querer viver para sempre aqueles momentos.
O que foi, já foi. É tempo de viver o presente.
É tempo de continuar vivendo.